Eu sou
apoiadora incondicional da amamentação. Quando fiquei grávida
esperava ansiosamente por esse momento. Quando ele aconteceu, depois
de alguns perrengues, foi maravilhoso! No início eu não entendia
mulheres que não queriam amamentar. Na verdade não só não
entendia, como também as julgava. E depois, ao longo do tempo, fui
vivenciando a maternidade e percebendo os vários aspectos emocionais
relacionados à amamentação e percebendo como é complexa essa
entrega. Laura Gutman, no livro A revolução das mães: o
desafio de nutrir nossos filhos, diz:
“Portanto, digamos com todas as letras: para dar de mamar temos que estar dispostas a perder toda a autonomia, liberdade e tempo para nós mesmas. É uma decisão. Na medida em que optemos por uma modalidade, perderemos vantagens na outra. Explicando de outra forma: se nos apegamos a nossa liberdade pessoal, possivelmente o bebê tenha que se conformar com outros alimentos, porque mãe e filho não encontrarão prazer nem relaxarão na amamentação. Ou, ao contrário, se decidimos dar prioridade a amamentação, perderemos liberdade e vida própria. Ambas as situações, amamentação e liberdade, não são compatíveis. Ninguém pode determinar o que é que cada qual deve fazer. Mas sim é importante que saibamos o que ganhamos e o que perdemos frente a cada decisão”
Confesso
que em alguns momentos amamentar pode ser bem cansativo e enfadonho,
principalmente quando há um aumento da demanda ou quando passamos
por estresses da vida cotidiana. Algumas vezes nesse um ano e cinco
meses de amamentação já cogitei a possibilidade de fazer o
desmame, por não estar disponível emocionalmente a me entregar pra
amamentação. No meu caso, quando passo por essas sensações
negativas procuro uma maneira de lidar primeiro com elas sem
interferir na amamentação, para perceber se consigo me resolver
para voltar a me entregar. E tem funcionado. Mas para algumas mães
não é possível, e é essencial conhecer nossos limites. Passei a
estudar cada vez mais como seria possível fazer um desmame
respeitoso com a criança e que respeitasse também os limites da
mãe, depois que algumas amigas passaram por situações emocionais bem complicadas que não seriam fáceis de resolver e que se sentiam exaustas para amamentar.
A
amamentação é muito importante pra saúde da mulher, do bebê e
para o vínculo de ambos. Previne doenças, aumenta o sistema
imunológico, auxilia na construção da confiança, no
desenvolvimento craniofacial, entre tantos outros benefícios.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) orienta amamentar exclusivamente
até os 6 meses e de maneira continuada até 2 anos ou
mais.
A composição do
leite muda de acordo com o crescimento da criança. O leite materno é
tão perfeito que contém exatamente o que a criança precisa naquela
faixa etária. Por exemplo, o leite materno no segundo ano de vida é
composto por:
- 95% do total de vitamina C necessária;
- 45% do total de vitamina A necessária;
- 38% do total de proteínas necessárias;
- 31% de calorias necessárias.
Outro
ponto importante é que a proteção imunológica continua enquanto a
criança é amamentada. Alguns benefícios extras de crianças
amamentadas são: ficam menos doentes, tem menos diarreia, vão menos
ao pediatra, tem menor risco de desenvolver obesidade, maior
facilidade de sociabilidade, são mais espertas e permite um
desenvolvimento emocional mais sólido. A amamentação se torna uma
importante atividade para auxiliar a criança a adquirir sua
independência. E essa aquisição ocorre de maneira natural quando
ocorre o desmame natural, pois não se força a criança a pular
estágios que ela ainda não alcançou de seu desenvolvimento.
Desconheço artigos científicos que tragam pontos negativos da
amamentação prolongada. O que os profissionais de saúde muitas
vezes indicam, um desmame a um ano de vida na verdade está
relacionado a fatores culturais e não às evidências científicas e
orientações da OMS e MS.
“O homem é o único mamífero em que o desmame (aqui definido como a cessação do aleitamento materno) não é primariamente determinado por fatores genéticos e instinto, sendo fortemente influenciado por fatores socioculturais. “ Elsa Regina Justo Giugliani, SBP
Um
estudo de 1993¹ relata que a idade média encontrada para o desmame
natural foi de 3 a 4 anos. O desmame precoce tem sido associado a uma
necessidade emergencial de maior independência das crianças; sem a
preocupação se ela está preparada para essa quebra. Ossos do
ofício do modo de vida ocidental pós industrial onde os bebês
aparentemente tem que sobreviver, porque a “vida não é fácil”,
“ter independência é muito importante”. Enfim, com a
industrialização da vida e o distanciamento do nosso eu, a relação
mãe e bebê acaba sendo desconexa, mecânica, o que prejudica as
interpretações dos símbolos que o bebê mostra. Ou seja, não há
uma comunicação eficaz entre mãe e o bebê. Mera coincidência ou
um reflexo da maneira que a sociedade vive?
“Hoje, em muitas culturas “modernas”, a amamentação prolongada (cujo conceito varia de acordo com a “convenção” da época e do local) freqüentemente é vista como um distúrbio inter-relacional entre mãe e bebê. Perdeu-se a noção de que o desmame não é um evento e sim um processo, que faz parte da evolução da mulher como mãe e do desenvolvimento da criança, assim como sentar, andar, correr, falar. Nesta lógica, assim como nenhuma criança começa a andar antes de estar pronta, nenhuma criança deveria ser desmamada antes de atingir a maturidade para tal. Em harmonia com esta linha de pensamento, Dr. William Sears, um antigo pediatra, recomendava “Não limite a duração da amamentação a um período pré-determinado. Siga os sinais do bebê. A vida é uma série de desmames, do útero, do seio, de casa para a escola, da escola para o trabalho. Quando uma criança é forçada a entrar em um estágio antes de estar pronta, corre o risco de afetar o seu desenvolvimento emocional”. Essas palavras sábias podem ter pouco respaldo em sociedades individualistas, que tendem a acelerar o processo de independização do ser humano, substituindo o seio por métodos de auto-consolo como chupetas, paninhos, mantinhas, ursinhos, etc. […] Já se avançou muito na valorização do aleitamento materno nos últimos tempos. A recomendação da duração da amamentação passou de 10 meses na década de 30 para dois anos ou mais nos dias de hoje. Atualmente, fala-se em desmame natural como a forma ideal de desmame, sem especificar uma idade mínima ou máxima para que esse processo ocorra. Apesar desse avanço ainda estamos longe de encararmos o desmame como um marco do desenvolvimento da criança. Para chegarmos a este estágio, faz-se necessário entender e enfrentar as circunstâncias que, segundo Souza e Almeida, “ultrapassam a natureza e desafiam a cultura e a sociedade”. Elsa Regina Justo Giugliani, SBP
Há
também uma sexualização do ato de amamentar. Culturalmente
crianças que andam e que são amamentadas são vistas com certa
desconfiança. Para algumas pessoas há até mesmo a desconfiança em
relação à saciedade e ao teor nutritivo que o leite materno pode
ter. O leite da vaca seria melhor? Não. O leite da vaca é do
bezerro. E não deveria ser de ninguém mais. Pela vaca, pelo bezerro
e pela saúde do nosso corpo, que consome uma bomba e sobrecarrega o
organismo desnecessariamente, desequilibrando-o e tornando-o mais
propenso ao desenvolvimento de doenças. (Saiba mais aqui)
“Através da amamentação, a mãe recebe uma resposta da boca do seu filho, das mãos dele, do corpo e dos olhos dele. Isso dá-lhe informação sobre como ele se sente e sobre o que ele está a fazer. Quase todas as mães que amamentam até mais tarde, afirmam que esta intimidade com o bebê é o elemento mais satisfatório da amamentação. Quando a mãe está a ter este tipo de prazer, ele transmite-se, por sua vez, ao seu filho. Os sorrisos dela, as carícias e o relaxamento do seu corpo, tudo isso ajuda a tornar a experiência da amamentação mais agradável para o seu filho, também. O contato da pele entre mãe e filho, estimula a hormona prolactina que pode aumentar os sentimentos maternais. Estes sentimentos maternais e de proteção em relação ao filho defende a criança de possíveis maus tratos e abandono por parte da mãe. Em países onde se tem melhorado e aumentado a amamentação devido às mudanças nas práticas hospitalares para que não haja separação entre a mãe e o bebé, encontrou-se uma redução no abandono de bebés por parte das mães.”¹
E quando
amamentar não é mais prazeroso para a mãe? Quado ela está
desgastada por diversos fatores de seu cotidiano, cansada
emocionalmente, o que fazer? Antes de orientar a como fazer um
desmame artificial de maneira gradual e mais respeitosa ao tempo do
bebê, é bom nos perguntarmos as motivações de realizar o
desmame, tomar consciência das consequências para mãe e bebê e
para que a mãe tome uma decisão. Eu mesma, em alguns dias
exaustivos ou em situações emocionalmente ruins, não sinto o
prazer e a disposição em amamentar que sinto em outras
oportunidades. Ajuda conversar com alguém, sair pra caminhar, ir a praia...
“O pedido de ajuda para desmamar deve ser ouvido e acolhido com um pouco mais de sensibilidade por parte de quem se propõe a ajudar, visto que, na maioria das vezes, quando a mulher consegue verbalizar verdadeiramente o que a incomoda ou deseja, e uma vez que isso é realmente sanado, a amamentação pode continuar seguindo tranquilamente um caminho de alegria e sintonia entre mãe e filho! Geralmente o pedido para desmamar é apenas um SINTOMA que demonstra outros problemas, outros desejos e necessidades daquela mãe, que são, na verdade, as coisas que precisam de cuidado e atenção. E passar por isso, para a mulher, pode ser uma ótima oportunidade para que ela aprenda a enxergar, verbalizar e legitimar seus verdadeiros sentimentos, desejos e necessidades! “ Luzinete R. C. Carvalho (psicanalista) (GVA)
Existem
alguns tipos de desmame: o abrupto, o noturno, o gradual e o natural.
O desmame abrupto é aquele feito sem levar em consideração o tempo
da criança, de maneira abrupta. O desmame noturno é o que
caracteriza um desmame guiado pelo bebê somente pelo período da
noite/madrugada. O desmame gradual é também guiado pelo bebê e
feito de maneira lenta. O desmame natural é o desmame ideal, quando
a criança deixa de mamar sozinha. Não existe receita de bolo para
fazer o desmame. Mas ele deve ser feito considerando a idade do bebê. No mínimo do mínimo um ano, mas mesmo assim as perdas são muito grandes. A partir dos dois anos pode-se considerar um mínimo com menos prejuízos. Cada binômio é um mundo diferente, carregado de
emoções, vivências, rotinas e pessoas diferentes. O que temos que
ter em mente, após conhecer e pesar na balança os motivos e os
prejuízos para o desmame é que ele deve ser feito de
maneira gradual, carinhosa e respeitosa ao tempo do bebê; por acordo
da mãe e do bebê.
Existem três aspectos que devem ser observados se existem sem a
amamentação para considerar o desmame, que são sinais da
maturidade e autonomia da criança: nutrição, afeto e comunicação.
Os
estudos científicos mostram que o desmame não melhora o sono, nem o
apetite e não torna o bebê um ser independente. Fique atenta a
profissionais de saúde que indicam desmame por prescrição de
medicamento. Muitos deles tem total desconhecimento que a maioria
dos fármacos são compatíveis com a amamentação. Confira a lista
de medicamentos que podem ser utilizados na amamentação de fontes
confiáveis aqui e aqui. O desmame natural ocorre quando o bebê está pronto, é um estágio
de seu desenvolvimento que foi atingido e que ele suspende por ter
suprido o que lhe faltava para seguir adiante.
Jamais
deve-se utilizar artifícios para que a criança rejeite o peito.
"O mais cruel e nocivo dos desmames abruptos é aquele que faz com que a criança prove no seio da mãe algo ácido, azedo ou amargo, especialmente quando isso é associado a uma visão terrível (seios pintados, com band-aid etc) do seio, objeto que até então só trazia prazer e que aparece repentinamente como algo assustador. […] Esses sentimentos e impressões ficam inscritos no córtex para o resto da vida, a confusão entre prazer e desprazer ficará gravada e um dos sintomas mais comuns será a inabilidade da pessoa para acreditar que merece prazer e que ele pode ser algo perene, confiável. Perdurará a impressão de que o prazer pode a qualquer momento virar uma ameaça. Nos piores casos a pessoa não consegue buscar o prazer, já caminha diretamente para a punição." Cláudia Rodrigues (retirado do Grupo Virtual de amamentação)
A
amamentação é o primeiro vínculo entre mãe e bebê e é preciso
compreender isso como a solidificação de uma relação de uma vida
inteira. O que ocorre nessa fase fica guardado e pode refletir na
infância e vida adulta em sentimento ruins sem causa aparentemente
explicável. Por isso é preciso mais sensibilidade para enxergar
esse momento e procurar ter respeito, amor e cuidado. O desmame
gradual permite uma adaptação física e emocional da mãe e do
bebê. Na mãe o desmame abrupto está relacionado à depressão,
ingurgitamento mamário, mastite. O desmame gradual respeita a
maneira que o bebê lida com a perda do contato íntimo da
amamentação ao ser substituída por outros contatos.
Existem
alguns métodos para o desmame noturno, como o da Elizabeth Pantley,
Dr. Jay Gordon (ambos em inglês). Em português traduzido o da Elizabeth Pantley tem na De Peito Aberto Esses métodos são guiados pelo bebê e não concordo com nenhum
deles plenamente. Talvez eles possam servir de orientação geral e
não como um passo a passo. É preciso estar atento aos sinais que o
bebê dá, considerar modificar outros aspectos e ir percebendo,
escutando seu coração para ver o que funciona melhor para vocês.
Deixo
abaixo como sugestão essas leituras para que as mães façam
decisões conscientes.
DIGA NÃO
AO DESMAME ABRUPTO.
Fontes:
-A revolução das mães: o desafio de nutrir nossos filhos - Laura gutman